terça-feira, 30 de outubro de 2018

Projeto Cinema no Beco

Projeto Cinema no Beco: toda quinta-feira, cerca de 50 crianças assistem a filme 
ou animação com a natureza como pano de fundo
Foto: Urbano Erbiste/Extra

Publicado originalmente no site do Jornal Extra, em 22 de abril de 2015

Morador da Maré coleta óleo usado, vende e, com a renda, leva cinema a crianças

Por Bibiana Maia e Roberta Hoertel 

Um litro de óleo usado, se descartado na pia ou no vaso sanitário, pode poluir uma quantidade de água limpa equivalente a um caminhão-pipa inteirinho. Mas, na Maré, o que sobra da fritura se transformou em cinema para as crianças. O projeto Cinema do Beco, criado há um ano e meio pelo morador Bhega Silva, de 56 anos, é financiado, em parte, com a venda de óleo de cozinha, recolhido de porta em porta na comunidade.

 Crianças recebem pipoca e refrigerante.  Endereço muda a cada semana
 e é anunciada em carro de som (Foto: Urbano Erbiste/Extra)

— Coloquei na cabeça que ia fazer um cinema. No início, me chamavam de doido, mas hoje acham lindo — conta Bhega, que também é músico e trabalha, de bicicleta e alto falante, fazendo propaganda do projeto na comunidade.

Bhega: preocupação com o meio ambiente remete à sua infância, na Maré 
Foto: Urbano Erbiste/Extra

Determinado, ele passou a recolher o óleo usado pelos moradores para vender, a R$ 0,80 cada litro, para uma refinaria de Bonsucesso. Cerca de 200 litros foram o suficiente para comprar equipamentos, como a lona para a projeção.

— Lembrei que o pessoal joga fora o óleo de cozinha e comecei a fazer a campanha na comunidade. Eu passo de bicicleta, e o pessoal doa. Ainda divulgo que o óleo entope e atrapalha o saneamento.

A cada semana, a projeção acontece em uma rua diferente, e o endereço é divulgado por carro de som. Com a popularização, o projeto ganhou parceiros que doaram projetor e fornecem pipoca e refrigerante para as cerca de 50 crianças que comparecem a cada sessão. Toda quinta-feira, são projetados filmes e animações que têm como pano de fundo a valorização da natureza, como “Tainá” e “Rio”, além de vídeos produzidos por Bhega.

Iniciativa conquistou parceiros, que patrocinam parte do projeto 
 Foto: Urbano Holanda/Extra

— Falo sobre dengue, poluição. Não tenho formação de meio ambiente. Aprendi vendo e ouvindo. Vamos fazendo devagarinho, falando da importância do planeta.

O interesse pelo tema vem da infância, na Maré. Bhega lembra-se dos tempos de fartura, em que pescadores doavam peixes pescados na Praia de Ramos, hoje poluída.

— Minha mãe me mandava buscar peixe, hoje não tem condições. Prometi que, enquanto estivesse vivo, faria algo pelo planeta, mesmo sendo trabalho de formiguinha.

Exemplo

Diante do problema dos baixos índices de coleta seletiva nos municípios do Rio, como o EXTRA mostrou no domingo e na segunda-feira, o presidente da Comissão de Meio Ambiente da Alerj e ex-ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc afirma que há medidas simples e baratas para serem tomadas e que podem elevar os níveis de reciclagem dos municípios.

— Primeiro, é preciso transferir a responsabilidade da coleta seletiva para a Secretaria de Meio Ambiente. Na maioria dos municípios as empresas de limpeza urbana são da Secretaria de Obras. Eles não têm consciência ambiental e tratam como qualquer outro serviço — explicou.

De acordo com Minc, um dos melhores índices do país está em Londrina, no Paraná. Desta experiência, que o deputado conheceu de perto, ele vê outras soluções para o problema do Rio. Uma delas é a parceria dos municípios com as cooperativas de catadores, viabilizando o trabalho dos profissionais. A construção de galpões ou ecopontos também é apontada como uma solução, além da conscientização ambiental.

— A solução é clara e não é cara. Os professores já estão na escola, os alunos também. Ensinando a garotada, você pega também os pais, tios, a família toda. As próprias escolas podem se converter em centro de reciclagem — explica Minc, lembrando que mais de 20 escolas fazem isso no estado do Rio.

Para o deputado, o projeto de Bhega, na Maré, é um exemplo de que é possível ajudar em todos os níveis de atuação:

— É uma atividade muito bacana, muito bonita. Mostra como é possível ajudar. Colaborar com o meio ambiente. E como esse esforço, de uma pessoa, dentro da Maré, teria um resultado muito maior se recebesse um incentivo, uma pequena kombi, galões.

Texto e imagens reproduzidos do site: extra.globo.com

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