Pereira, da Vídeo Connection: “Faço o que faço por paixão”
Reinaldo Canato/Veja SP
Publicado originalmente no site da revista VEJA SÃO PAULO,
em 28/04/2017
As últimas videolocadoras à moda antiga de São Paulo
Após a derrocada desse tipo de negócio, alguns
estabelecimentos resistem ao tempo e atraem cinéfilos nostálgicos
Por Carolina Giovanelli
Esquadrinhar as prateleiras por meia hora em busca do filme
ideal. Descobrir que todas as cópias do último lançamento já foram locadas.
Bater um papo com algum funcionário cinéfilo para obter indicações. No caixa,
tentar lembrar de cor o número de sua carteirinha. Pagar multa porque não deu
para ver tudo no prazo ou, nos tempos do VHS, esqueceu de rebobinar a fita.
Antes tão comuns, as idas à videolocadora tornaram-se
programa praticamente do passado. Após o quase desaparecimento desse tipo de
negócio, ainda há endereços que resistem ao tempo e fazem a alegria da turma
nostálgica.
Muitos dos empreendimentos remanescentes, porém, tomam hoje
o cinema como coadjuvante. Depois da compra da marca Blockbuster, parte da
Lojas Americanas, por exemplo, conta com o serviço, mas de modo acanhado, em
meio a um mundaréu de outros produtos.
Entre as poucas videolocadoras à moda antiga por aqui,
aparece a Vídeo Connection, instalada no térreo do Edifício Copan, no centro.
Muita gente que não costuma frequentar o pedaço passa por lá como se deparasse
com uma joia rara. Dia sim e outro também, o sócio Paulo Sérgio Baptista
Pereira ouve interjeições de saudade ou espanto — há criança que nem sabe para
que serve o lugar.
De seus 60 anos, 32 são dedicados ao imóvel de 50 metros
quadrados, distribuídos em três pequenos andares. Nos tempos áureos, na virada
dos anos 90 para os 2000, eram locados até 4 000 filmes por mês. Hoje, são
aproximadamente 750.
“Faço o que faço por paixão, não para ficar rico”, afirma
Pereira, que assiste a pelo menos quatro produções por semana e tem dicas do
que ver na ponta da língua. Em um discreto ato de resistência, ele não tem em
casa nem TV a cabo nem Netflix, alguns dos pivôs da derrocada do mercado.
Petruche, no Charada: 880 filmes alugados em um só dia nos
tempos áureos
Foto: Ricardo D'Angelo/Veja SP
O empresário chegou a empregar cinco funcionários. Agora,
cuidam do espaço somente ele e a filha, a psicóloga Daniela. Faturam por mês
cerca de 6 000 reais, ante os mais de 20 000 reais do passado. A clientela é
formada principalmente por moradores do complexo e dos arredores. Mas existem
interessados que se deslocam de outros bairros apenas para aproveitar a
experiência das antigas.
Outra referência no mercado é Gilberto Petruche, de 61 anos.
Desde 1995, o paulistano toca o Charada Clube, na região de Sapopemba, na Zona
Leste. Trabalha com uma variedade de 17 000 títulos em DVD, Blu-ray e VHS.
Assim como a Vídeo Connection, seu negócio costuma dar um prazo mais flexível
às devoluções.
A fim de movimentar o espaço, promove há um ano shows de
rock de bandas independentes — o próximo será em 13 de maio. Os grupos ocupam a
sala de produções pornôs (hoje, “escondidas” em pastas) e reúnem até 200
pessoas durante o dia. As vendas de discos de vinil e de parte do acervo de
filmes ajudam a reforçar o orçamento.
Entre as raridades, está a fita Amor Estranho Amor (1982),
longa em que Xuxa aparece em uma cena picante com um adolescente. Petruche
avalia a pérola em 5 000 reais, mas, por enquanto, não quer abrir mão dela. Há
um ano, o proprietário amarga prejuízos. “Houve uma época em que entravam 35
000 reais por mês, e já aluguei 880 filmes em um só dia”, lembra ele, que
chegou a comprar 55 cópias de Titanic. “Atualmente, ganho 2 000 reais, que são
gastos com aluguel e outras despesas. Estou na UTI.”
As videolocadoras perderam a força principalmente por causa
da pirataria, da TV a cabo e dos serviços especializados na internet, como a
Netflix. Até as grandes redes se renderam à crise. Especializada em títulos
cult, a 2001 Vídeo fechou as portas em 2015. Hoje, atua apenas no papel de
e-commerce.
Em junho, estreia o documentário CineMagia — A História das
Videolocadoras de São Paulo, que relembra a trajetória desses pontos desde seu
surgimento na cidade, nos anos 70. Filmado a partir de 2014, durante dois anos,
ele capturou o último suspiro de algumas cadeias. “Foi tudo muito rápido”, diz
o diretor, Alan Oliveira. Neste ano, o cineasta pretende também lançar um livro
e uma websérie com as dezenas de depoimentos coletados.
Texto e imagens reproduzidos do site: vejasp.abril.com.br
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